PRODUTOS SEM IMPOSTOS
Governo revê acordo sobre
free shops e RS é o Estado mais beneficiado
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EM JAGUARÃO FREE SHOP FUNCIONA DESDE AGOSTO |
Medida aumenta a lista de produtos que podem ser vendidos em lojas na fronteira. Países do Mercosul reclamam de concorrência desleal
Após o governo revisar um acordo
do Mercosul sobre a instalação de free shops terrestres no Brasil,
os demais países que fazem parte do bloco econômico se queixaram da medida. A
Receita Federal brasileira aumentou a lista de produtos a serem vendidos nesse
tipo de loja, o que irritou Argentina, Paraguai e Uruguai. O principal Estado
beneficiado pela medida é o Rio Grande do Sul, que concentra um terço das
cidades brasileiras onde é possível abrir um free shop.
A mudança da Receita Federal brasileira ampliou a lista de produtos a serem
vendidos em comparação com o acordo firmado entre os países do Mercosul em
dezembro de 2018: agora, é permitida a oferta de produtos de cesta básica,
eletrodomésticos de grande porte, armas, maquinário agrícola, materiais de
construção e pneus.
Antes proibida, a instalação de lojas francas em fronteiras terrestres do
Brasil foi possibilitada com uma lei de 2012. Após a regulamentação, as
primeiras unidades começaram a ser abertas neste ano.
A insatisfação de Argentina, Paraguai e Uruguai com o aumento da oferta
de produtos em free shops brasileiras foi manifestada em reunião do Grupo
Mercado Comum (órgão do Mercosul) em Brasília na semana passada. As delegações
dos países reclamaram ao Brasil que a mudança coloca em risco os comércios
locais nas cidades da fronteira. O argumento é de que as lojas do lado
brasileiro ficam em vantagem em relação às lojas estrangeiras, que, em alguns
casos, ficam a poucos metros de distância.
Por lei, free shops de fronteira só podem ser
abertos em cidades-gêmeas — as que fazem limite com municípios de um país
vizinho. Há no Brasil 33 cidades-gêmeas, 11 delas no Rio Grande do Sul: Barra
do Quaraí, Uruguaiana, Jaguarão, Quaraí, Aceguá, Chuí, Itaqui, Porto Xavier,
Santana do Livramento, São Borja e Porto Mauá.
A abertura de free shops é a grande aposta da Fronteira, região gaúcha
que sempre enfrentou dificuldades econômicas.
Até agora, estão autorizados free shops em Uruguaiana, Barra do Quaraí e
Jaguarão – nesta última cidade, já há uma loja funcionando desde agosto, como mostrou a
colunista Giane Guerra. Em Santana do Livramento, o prefeito
está comprando asfalto para arrumar os acessos — a cidade planeja construir um shopping enorme para
abrigar as lojas francas.
O desconforto com a medida da Receita Federal
brasileira foi tamanho que os sócios do Brasil no Mercosul fizeram questão que
a "preocupação" constasse na ata do encontro do Grupo Mercado Comum.
Segundo participantes, os free shops foram o principal ponto de tensão na reunião.
Também existem regras sobre quanto cada pessoa pode
comprar: há um limite de US$ 300 em mercadorias, num prazo de 30 dias.
A criação de lojas francas em fronteiras sempre
teve resistência na área técnica da Receita, que aponta problemas como a perda
de arrecadação. Mas defensores desse mercado encontraram forte respaldo no
governo Bolsonaro.
No Planalto, o principal impulso veio do ministro
Onyx Lorenzoni (DEM). Ele promoveu reuniões na Casa Civil sobre o tema e
patrocinou um encontro entre parlamentares que defendem a pauta e líderes
empresariais com o ministro Ernesto Araújo (Relações Exteriores), em fevereiro.
Procurado, Lorenzoni não se manifestou.
No Rio Grande do Sul, a agenda é tocada pelo
deputado estadual Frederico Antunes (PP), presidente da Frente Parlamentar em
Defesa da Implantação de Free Shops em Cidades de Fronteira.
O parlamentar refuta as críticas e diz que
instrução da Receita de agosto teve por objetivo colocar o Brasil em igualdade
com os demais membros do Mercosul. Segundo ele, essas nações já podem
comercializar diversos itens nos seus free shops terrestres e o Brasil vinha
sofrendo prejuízos.
— Não podemos voltar a ter assimetria. Alguns
países iriam ficar vendendo esses produtos e não poderíamos fazer o mesmo —
afirma.
O argumento é rebatido pelos outros sócios do
Mercosul. Interlocutores no governo do Uruguai disserem que, embora o país
tenha free shops de fronteira com o Brasil desde a década de 1980, esses
estabelecimentos comercializam só bebidas, perfumes, roupas e produtos de luxo,
em regime similar ao aplicado nas lojas de aeroporto.
Com cidades brasileiras vendendo pneus e itens de
cesta básica livre de impostos, o Uruguai teme até que alguns produtos terminem
em Montevidéu, a 300 km da fronteira.
A Argentina tem situação semelhante, mas menos
intensa. Hoje, as lojas francas terrestres funcionam apenas em uma cidade,
Puerto Iguazú, gêmea de Foz do Iguaçu.
O governo brasileiro refuta as queixas e diz que a
instrução normativa retoma regra criada em março de 2018. Segundo o governo
Bolsonaro, a revisão foi necessária porque apenas o Uruguai até o momento
ratificou internamente a resolução do bloco comercial. Sem a retomada de uma
lista ampla, afirmam, o Brasil teria prejuízos.
"Como a resolução ainda não foi implementada
pela totalidade dos países-membros do bloco, o Brasil optou por permitir a
oferta de produtos para eliminar a desvantagem concorrencial das lojas
brasileiras perante as dos países vizinhos", afirma a Receita.
O Itamaraty usou argumento semelhante: "Apenas
o Uruguai internalizou a resolução do Mercosul até o momento e,
consequentemente, a referida norma não se encontra em vigor. O governo
brasileiro tem a obrigação de internalizar a resolução ou, alternativamente,
deve propor a sua revogação aos sócios do Mercosul".
O Ministério das Relações Exteriores, porém, não
adiantou qual posição o país deve tomar em relação ao tema.
Os quatro membros do Mercosul têm regras diferentes
para ratificar internamente a resolução do bloco econômico.
A Argentina possui o processo mais complicado, que
demanda aprovação do Congresso. Com o país no meio de um processo eleitoral, a
avaliação é de que o trâmite levará tempo.
Regras de compras em free shops
A cota máxima de compras é de US$ 300 por CPF ou o
equivalente em outra moeda a cada intervalo de 30 dias em compras de produtos
nacionais. Já o excedente em mercadorias importadas terá taxa de 50%. O
software fará este controle e também quanto à quantidade de alguns itens:
·
Bebidas
alcoólicas - 12 litros
·
Cigarro - 20
maços
·
Charutos ou
cigarrilhas - 25 unidades
·
Fumo preparado
para cachimbo - 250 gramas
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