Governo do RS quer que policiais usem câmeras no uniforme até o final do próximo ano
Prazo é estipulado pelo vice-governador e secretário da
Segurança, Ranolfo Vieira Júnio. Grupo de trabalho de questões raciais sugeriu
uso de tecnologia como forma de reduzir casos de racismo
O Rio Grande do Sul
quer iniciar o uso definitivo de câmeras em policiais civis e militares ainda
em 2022, dentro do governo Eduardo
Leite. A afirmação é do vice-governador e secretário da Segurança,
Ranolfo Vieira Júnior. Segundo ele, os detalhes do contingente que vai usar o
equipamento e outros pontos do projeto ainda estão em estudo, mas o objetivo é
já abrir o processo de aquisição da tecnologia até dezembro de 2021.
— Nós trabalhamos com a ideia de fazer a implementação ainda
dentro do nosso governo, com certeza. Mais cedo ou menos cedo, (o uso
das câmeras) vai chegar a todas as polícias do Brasil — declarou.
Em março de 2021, o Rio
Grande do Sul começou a testar os equipamentos em policiais da Brigada Militar
e da Polícia Civil. Foram escolhidos agentes das Rondas Ostensivas com
Apoio de Motocicletas (Rocam) do 9º Batalhão de Polícia Militar, no Centro de
Porto Alegre, e agentes da 1ª Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento e do
Departamento de Homicídios. Os testes terminaram em maio.
Segundo Ranolfo, a pasta vai fazer uma análise da conclusão
que o período de testes vai trazer, podendo sugerir alterações para
aperfeiçoamento do procedimento para, depois, definir se a forma de aquisição
vai ser por meio de compra ou aluguel dos equipamentos. O secretário já tem o
relato de alguns policiais, que avaliaram o uso positivamente.
— Eu tenho relatos, ao menos da Polícia Civil, positivamente
do uso do equipamento corporal. Nas abordagens, as pessoas demonstravam
inibição quando percebiam que estavam sendo filmadas. Então, tem a reação da
própria sociedade estranhando esse tipo de equipamento. Na semana passada,
participei do Fórum de Segurança Pública, com os 27 secretários de segurança do
brasil, e um dos temas que nós discutimos foi exatamente a utilização de
câmeras corporais — complementou.
Após o batalhão do Centro de Porto Alegre e a unidade de
pronto atendimento da Polícia Civil, a ideia inicial da secretaria seria
ampliar o uso de câmeras corporais para a Região
Metropolitana e as 23 cidades do RS Seguro — o programa da pasta
que define os municípios com prioridade de investimento a partir da análise dos
dados criminais, além de unir ações de outras pastas do governo.
A sugestão do uso de câmeras de segurança é uma das
conclusões que chegou o Grupo
de Trabalho de Combate à Violência Contra a População Negra, composto
por representantes dos órgãos dos poderes Executivo, Judiciário, Ministério
Público, Tribunal de Contas, Defensoria Pública, Conselhos, Organizações da
Sociedade Civil, professores e pesquisadores. O grupo foi implementado em 2020
após a morte
do engenheiro eletricista Gustavo dos Santos Amaral em uma
barreira da Brigada Militar em Marau, no Norte gaúcho. O rapaz foi morto por
engano por um brigadiano que acreditava que segurava uma arma, quando na
verdade era um celular. O caso foi arquivado pela Justiça.
Em 10 de agosto, o grupo apresentou as conclusões do tempo de
estudo ao governador Eduardo Leite, em uma cerimônia no Palácio Piratini. Foram
apresentadas 24 propostas de prevenção ao racismo no Rio Grande do Sul, a
maioria com foco na segurança pública.
Na avaliação de Gilvandro Antunes, sociólogo integrante do
Movimento Vidas Negras Importam e participante do grupo de trabalho, a
implementação do uso de câmeras é de extrema importância e auxiliaria vítimas a
comprovar os crimes.
— Muitas denúncias ocasionam que a vítima não consegue a
prova material. Então, acaba se tornando uma guerra de versões. Nessa guerra de
versões, ocorre que tem uma vítima, muitas vezes negra, pobre e de baixa
escolaridade, contra a versão de um servidor que tem fé pública, toda a
legitimidade estatal, para, muitas vezes, agir com truculência. Para nós, é de
extrema importância (o uso de câmeras) — argumentou.
Guilherme Amaral, irmão gêmeo do rapaz morto na abordagem,
entende a instalação de câmeras como uma forma de evitar que mais casos como o
de Gustavo aconteçam:
— Com esse relatório e principalmente a lei das câmeras, vai
mudar bastante, a gente tem essa esperança, até como mudou em São Paulo e outros
lugares. É nítida a mudança e o número baixo desses eventos. Isso é muito
importante para todos nós.
Lei no RS e uso em SP
Enquanto o governo do Estado faz movimentos para implementar
as câmeras por decisão própria, na Assembleia
Legislativa tramita um projeto de lei que obriga policiais a
usarem o equipamento. A iniciativa, de autoria da deputada Luciana Genro
(PSOL), leva o nome de Gustavo.
O projeto foi protocolado em setembro de 2020, mas até hoje
está na Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia, instância inicial que
avalia os aspectos constitucional, legal e jurídico das proposições. Seis
deputados da base governista pediram vistas do texto, o que faz a tramitação
demorar mais. A expectativa é de que o projeto seja votado na comissão na
próxima semana.
No Estado
de São Paulo, segundo reportagem do G1, a instalação de câmeras no
uniforme de policias militares fez com que a letalidade nas ações caísse, pela
primeira vez, para zero em junho de 2021 nos 18 batalhões em que o equipamento
foi utilizado. Ou seja, ninguém morreu em confrontos com policiais que estavam
utilizando esse equipamento.
Para o secretário da Segurança do RS, no entanto, não é
possível associar a queda ao uso das câmeras:
— São Paulo é o Estado que está a frente nessa questão. Os
primeiros dados apontam nesse sentido de diminuição de mortes em confronto com
a Polícia Militar, mas ninguém pode afirmar, nesse momento, por esse retrato
muito curto, que tenha sido em razão disso, em razão das câmeras corporais.
As outras propostas do Grupo de Trabalho
Além da aquisição de câmeras, as propostas do grupo de
trabalho envolvem outros pontos, como novos protocolos de abordagem e aumento
das horas sobre direitos humanos e medidas antirracismo na capacitação dos
agentes.
Um dos nomes à frente do projeto, a secretária da Igualdade,
Cidadania, Direitos Humanos e Assistência Social, Regina Becker, diz acreditar
que a maioria das ideias vai ser implementada:
— Nunca devemos esquecer que o Estado trabalha com orçamento,
não temos condições de fazer suplementação orçamentária que não tenha sido
aprovada dentro dos parâmetros legais. De acordo com as condições, essas ações
serão implementadas. Não tenho qualquer dúvida sobre isso.
Confira as propostas
Proposta
• Instalação, criação e acompanhamento
• Secretaria específica contra o racismo
• Selo de acreditação
• Ouvidoria antirracista
• Fiscalização
• Apresentação de relatórios anuais
• Relatório de cotas nas instituições públicas
• Conferência estadual com a temática das diversidades
• Parceria com a ONU
• Decreto/lei
Medidas de governo
• Comissão de Letalidade
• Comitê de Monitoramento
• Renovação do GT
Ensino
• Capacitação sistêmica dos agentes de segurança
• Direitos humanos no setor privado
• Concursos públicos
Treinamento
• Protocolo de abordagem 1
• Protocolo de abordagem 2
• Protocolo de abordagem 3
• Uso proporcional da força
• Técnicas apuradas de defesa pessoal
Tecnologia
• Controle interno e externo da atividade policial
• Banco de dados de ações
• Uso de câmeras e GPS
Recursos financeiros
• Destinação de recursos financeiros para órgãos públicos que
trabalhem diretamente com questões étnico-raciais
GAUCHA ZH 18/08/2021
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